quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Referendo ao aborto

...e finalmente o referendo lá se realizou (após um gasto de 9 milhões de euros, ao que parece). O "sim" desta vez lá ficou à frente do "não" e a abstenção venceu, mais uma vez, por maioria absoluta.
Desde sempre me pareceu que os portugueses, ou a sua maioria, não queria este referendo. Não queria abordar este assunto desta forma decrepita, por este ser um tema sem escolha possível numa sociedade liberal.
Tratou-se, desde sempre, este assunto sem a seriedade que se exige para o tratar como um jogo de futebol. Com ataques e contra-ataques e apitos dourados pelo meio, muitos cartões amarelos e vermelhos e os palavrões do costume... absolutamente desnecessário este triste espectáculo! Ambas os "clubes" tiveram os seus momentos negros. Nem por um momento se discutiram políticas de educação sexual e planeamento familiar. Nem de acompanhamento pré e pós vida... Ao invés, dei-me a ler no New York Times o tal padre que escreveu cartas em nome de "fetos" entregues em mão pelos filhos aos pais e tivemos as palmas e a fúria da vitória do SIM no final como se tivesse sido uma vitória a penaltys...

A maioria dos portugueses não votou. A maioria dos portugueses sempre apoiou a despenalização do aborto, o que não se achava era capaz de colocar um cruz onde se diz SIM ao aborto. Por peso de consciência. Pela violência. E, porque não era isso que deveria de ser discutido. Será difícil de compreender que nem todos se sentem confortáveis perante tamanha violência? Será difícil de entender que provavelmente ninguém é a favor do aborto, mas sim do desenvolvimento de políticas de educação sexual de planeamento familiar, de acompanhamento pré e pós vida, de defesa da mulher na tentativa de a ajudar nos seus problemas que a levam a essa trágica decisão e não em atirá-la para a clandestinidade onde a vida é o preço do risco???

Os referendos parecem uma invenção do Parlamento para se desmarcarem dos assuntos mais incómodos. Ou como o Carlos Magno disse, parecem lembrar os estudos de impacto ambiental: quando alguém está para começar algo, pede-se um estudo de impacto ambiental para simplesmente parar tudo...
A minha opinião sobre referendos é que eles são, exceptuando casos muito extraordinários, absolutamente desnecessários. Para quem teve uma educação liberal e se assume como tal e que interpreta o mundo dessa forma, referendar assuntos que não interferem com a liberdade individual de cada um, é uma "anormalidade" ridícula.
Eu sou a favor da despenalização do aborto porque sou liberal. E como Fernando Pessoa definiu, o liberalismo é a doutrina que defende que o indivíduo tem o direito de pensar o que quiser, de exprimir o que pensa como quiser, e de pôr em prática o que pensa como quiser, desde que essa expressão ou essa prática não infrinja directamente a igual liberdade de qualquer outro indivíduo.